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Qual a Encomenda: Conhecimento ou Informação?


Gestão do Conhecimento e Gestão da Informação são coisas diferentes, já disse antes. Como o tema continua suscitando muitas dúvidas entre alunos e profissionais com os quais tenho tido o prazer de conversar, faço este remake. Me desculpem os que já leram.

Primeiro, queria esclarecer que distinguir não significa glorificar uma ação e demonizar outra. Afinal, as organizações do século XXI (empresas privadas e governos) não sobreviverão sem domínio absoluto sobre ambas as práticas.

Em uma hipotética escala, conhecimento está mais perto das pessoas e a informação da tecnologia. Os atributos esperados dos profissionais que levarão estes trabalhos para a frente, segundo meu julgamento, devem considerar, a bem do trabalho, esta peculiaridade.

Para facilitar a explicitação de meu ponto de vista, gostaria de dividir as competências esperadas em cinco pontos: qualificação, cultura, colaboração, liderança/empreendedorismo e criatividade. As diferenças entre os dois programas, me parecem, tornam-se mais claras a partir deste corte.

Em relação à qualificação, é inconteste que o sucesso de ambos os projetos depende da excelência dos profissionais envolvidos. Duas competências, em especial, são comuns neste caso: conhecer o negócio, sabendo para onde aponta o vento - essencial em tempos de mudança acelerada – e domínio da tecnologia da informação e comunicação. As demais habilidades requeridas são, no entanto, bastante distintas. A implementação de programas de Gestão da Informação demanda profissionais com bom domínio de métodos quantitativos e funções estatísticas para tratar dados e informações já exteriorizados, o chamado conhecimento explícito. Os de Gestão do Conhecimento requerem, prioritariamente, qualidades de articulação e fidedignidade, uma vez que o capital a ser trazido para a organização ainda reside na cabeça dos colaboradores, na forma de conhecimento tácito.

Na dimensão cultura, os impactos oriundos da implantação dos dois projetos são mais distintos. Embora ambos envolvam mudanças de postura, a Gestão da Informação conta a seu favor com o fato de que suas práticas já estão culturalmente mais maduras, facilitando sua disseminação pela Casa. No que toca a Gestão do Conhecimento, por envolver mudanças mais profundas em paradigmas organizacionais há muito arraigados, herdados da era industrial, e por estar ancorado no uso técnicas muito recentes, ainda pouco familiares para a grande maioria das organizações, tais como comunidades de prática,storytelling, gestão da inovação, só para exemplificar, o caminho será sempre mais longo.

No que aponta para a colaboração, ela é estratégica em ambos os programas. A vantagem para os programas de Gestão da Informação, é que estes trabalham com uma matéria prima que já foi exteriorizada, que já pertence à organização, ainda que em muitos casos capturadas por silos, que dificultam sua circulação, baseados no surrado e ultrapassado bordão “informação é poder”. Já a Gestão do Conhecimento tem que ultrapassar uma barreira a mais, qual seja estimular as pessoas a colocarem à disposição da organização o seu conhecimento tácito, saber interiorizado de difícil articulação e que jamais será arrancado a fórceps, o que por si só já mostra a necessidade de relações interpessoais profundas, normalmente não requeridas nos projetos de Gestão da Informação.

Também no quesito liderança e empreendedorismo, os programas de implantação de Gestão do Conhecimento envolvem intervenções mais complexas. Ainda que as organizações modernas, todas elas requeiram lideranças fortes que saibam motivar times, o gás a ser dedicado a sensibilizar para a importância do conhecimento será ainda mais forte, pois implicará em mexer em zonas de conforto, conviver com o erro, e correr outros riscos que demandarão, além de liderança, forte espírito de empreendedorismo interno.

Finalmente em relação à criatividade, enxergo aí a maior diferença entre projetos de Gestão da Informação e do Conhecimento. Enquanto o primeiro repousa em rotinas, o segundo, em quebra de rotinas. Explicando melhor, a sociedade do conhecimento, com seus curtíssimos ciclos de vida, irá despejar, cada vez mais, sobre as organizações situações e problemas inéditos e, por isso mesmo, não captados pelo espelho retrovisor. Lembram-se da organização que aprende do Peter Senge? É por aí. Sobreviver, neste cenário, implicará em um suceder de novos produtos e serviços, cada vez mais intensos em conhecimento, fruto de soluções ousadas e criativas.

Embora haja profissionais que transitem bem por ambos os projetos, considerar essas minúcias, sinto, ajuda a escolher melhor as pessoas que tocarão um ou outro desafio e o que é também muito importante, irá colaborar para esclarecer o cliente sobre as entregas esperadas em cada uma das ações. Isto evitará muita saia justa, acreditem.

Comentários

Anônimo disse…
Gostei muito do artigo.

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