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Uma no cravo, outra na ferradura: Compartilhamento de serviços entre entidades governamentais + orçamento participativo

Os efeitos não previstos de políticas públicas podem assumir formas muito interessantes. Como já falei por aqui, a aliança de Conservadores-Democratas Liberais predica a “Grande Sociedade” como a solução para as aflições nacionais. Isso significaria aumentar a participação de cidadãos, grupos comunitários, ONGs na entrega de serviços públicos. A agenda do “Localismo” deveria ser a peça legislativa que transformaria essa idéia em realidade.

Pode ser que isso realmente aconteça ao longo do tempo, porém a reação imediata dos governos locais à necessidade premente de reduzir custos é a formação de parcerias de longo prazo com outras instâncias de governo para reduzir custos de back-office. Aqui em Kingston o governo local está se estruturando para compartilhar serviços com outros governos locais geograficamente próximos, em um programa batizado de “One Kingston”.

Kingston Bridge


Crédito: Paul Easton @ Flickr

Um exemplo é o desenvolvimento de um novo sistema de folha de pagamento em conjunto com outras duas autoridades locais. Outro é o compartilhamento de um executivo de primeiro escalão com o Sistema Nacional de Saúde - NHS. Mais um: Kingston está estudando a união com o governo local de Richmond para prestação de serviços para crianças e adolescentes (isso inclui educação, saúde e assistência social, entre outros).

(É interessante imaginar analogias para esse movimento no contexto brasileiro: o Ministério da Saúde compartilhando um diretor senior com uma Secretaria de Saúde estadual? Ou as prefeituras de Leme e Araras definindo conjuntamente o plano de melhoria das escolas? Duas cidades do ABC compartilhando seus sistemas de folha de pagamento? Até que ponto movimentos como esse esbarrariam no Brasil em barreiras legais, ou até constitucionais?)

Não é claro até que ponto esta saída dos serviços compartilhados é consistente com a agenda do Localismo, e de certa forma parece contradizê-la. Mas Kingston também tem contribuído com a agenda do localismo da aliança – afinal a assembléia daqui é predominantemente democrata liberal. O governo central tem facilitado uma série de projetos pilotos (o número total varia de acordo com a fonte, mas é algo em torno de 25) ao redor do país para colocar em prática conceitos de orçamentos comunitários e serviços locais integrados. Kingston faz parte deste grupo de pilotos, e o local escolhido para tal foi o distrito de Norbiton, com sete mil habitantes.

E o interessante é que a inspiração para esses pilotos é a experiência brasileira com orçamentos participativos. Quem diria que o Brasil iria se tornar referência em administração pública para o Reino Unido?



Publicado também no Observatório do Conhecimento.

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